quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

A mercearia do meu bairro.

O meu bairro tem uma mercearia.

Aliás, o meu bairro tinha uma mercearia nos anos 80 (antes disso, não me lembro), mudou de donos, esteve fechada durante uns anos e, agora, na onda do renascimento das mercearias e das tascas (mas sem os balcões riscados pelo amolar da faca de cortar o presunto e sem as nódoas de azeite sob pena de fecharem as portas por ordem da Asae), o meu bairro volta a ter uma mercearia.

Cresci num bairro de vivendas simples, cada uma com o seu quintal (o que chamávamos à parte da frente) e o seu pátio (o que chamávamos à parte de trás) construído, na altura, fora da vila (agora cidade).

Houve uma altura  em que teve o nome do governante da época, mas que, após a efusividade do 25 de abril, passou a ter a graça de Vila Morena, e agora as ruas até têm nomes de artistas da época (sempre é mais simpático uma Rua Natália Correia ou Zeca Afonso do que uma Rua Mário Soares...).

A maioria das pessoas vinha dos campos, das aldeias em redor e, por isso, nos pátios, alguns vizinhos plantavam árvores, outros tinham hortas, outros alpendres fechados com ramos de videira que, claro, davam uvas e, muitos deles, como a minha avó, tinham galinheiro com criação de galinhas, coquichas, patos e coelhos, porque o campo não estava realmente longe.

Quase todas as casas tinham garagem, ou uma abertura na frente da casa para isso mas, nessa altura, quase ninguém tinha carro, e era ver garagens usadas como sala, quarto extra para visitas, quarto de brincadeira dos miúdos, refúgio secreto dos adolescentes cheios de revistas do Tio Patinhas, alpendre para apanhar sol, nas abertas, armazém para secar as maçãs das árvores do quintal ou, como no caso de uns vizinhos, transformada em mercearia.

Claro que, nessa altura, tiveram de comprar uma Ford Transit vermelha para levar as mercadorias, e deixaram de ter garagem...

 O facto é que, depois de passarem a mercearia para outras mãos porque se aventuraram noutro negócio, de ter estado fechada uma data de anos, a bela da mercearia lá do bairro voltou a abrir pela mão dos descendentes dos proprietários originais (afinal, a casa ainda é a deles), meio renovada, meio com sabor aos velhos tempos, uns aventais todos janotas, e voltou a juntar na mesma esplanada (ex quintal) os habitantes do bairro.

Parece que tudo volta ao mesmo.

Vou começar a contar com aquela noite quente de Verão em que um vizinho mete a televisão no parapeito da janela, para os outros vizinhos verem o telejornal e a novela...



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